Até poucos anos atrás, não era tão comum o uso de assinatura eletrônica, principalmente em contratos particulares. Aos poucos – e principalmente durante e após a pandemia –, essa prática foi se tornando comum mas, ainda assim, continuou (e continua) despertando muitas dúvidas e inseguranças, inclusive no dia a dia de profissionais do direito.
As vantagens de se permitir a assinatura eletrônica de contratos são enormes. Negociações complexas envolvendo inúmeras partes espalhadas em diferentes municípios, estados e até países podem ser concluídas e formalizadas em um só dia, com uma simples assinatura pelo computador ou até pelo celular, com inegável ganho de agilidade e economia.
Mas e segurança? Afinal, o contrato assinado eletronicamente é válido? Tem valor de título executivo? Depende do tipo de assinatura eletrônica?
Em meio a essas e outras dúvidas sobre o tema, em 14/07/2023 entrou em vigor a Lei Federal 14.620/2023, que incluiu o §4.º no artigo 784 do Código de Processo Civil, validando, agora expressa e oficialmente, os contratos assinados eletronicamente:
“Nos títulos executivos constituídos ou atestados por meio eletrônico, é admitida qualquer modalidade de assinatura eletrônica prevista em lei, dispensada a assinatura de testemunhas quando sua integridade for conferida por provedor de assinatura”.
Vale lembrar que a Lei Federal 14.063/2020 (conhecida como Lei da Assinatura Digital) regulamentou três espécies de assinaturas eletrônicas, descritas abaixo em ordem crescente de grau de confiabilidade:
=> Simples: permite a identificação do signatário por meio da associação das informações a dados eletrônicos.
=> Avançada: pode utilizar certificados digitais não emitidos pela ICP-Brasil e outros métodos de segurança (biometria, token ou PIN – Personal Identification Number, que é um código criado exclusivamente para identificação do usuário).
=> Qualificada: também chamada de assinatura digital, que é validada por meio dos certificados digitais ICP-Brasil, emitidos por uma entidade credenciada (Autoridades Certificadoras – AC).
O ICP-Brasil (Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira) – exigido para caracterização da assinatura como qualificada – é um conjunto de entidades, regulamentos e procedimentos mantido pelo Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (ITI), órgão coordenado pela Casa Civil, vinculada ao Governo Federal, que foi criado para amparar o sistema criptográfico brasileiro, que serve como base de segurança dos certificados digitais e, assim, permite a identificação virtual do cidadão e de empresas.
Essa é a razão de a assinatura qualificada, validada por meio de certificados ICP-Brasil, apresentar o maior grau de confiabilidade, de modo que contratos firmados por este meio equivalem – ou chegam a ser até superiores – a instrumentos físicos, firmados de próprio punho.
De todo modo, a nova Lei não faz distinção entre as espécies de assinatura eletrônica para fins de validade do contrato como título executivo extrajudicial. Assim, mesmo as assinaturas eletrônicas simples ou avançadas (não validadas por certificados ICP-Brasil) podem ser validamente usadas em contratos – embora seja conveniente, nestes casos, pelo menos a previsão contratual de concordância das partes quanto à adoção da assinatura eletrônica.
Note-se que o novo dispositivo legal também põe fim a uma discussão jurisprudencial sobre a necessidade de assinatura de duas testemunhas para validação do contrato assinado eletronicamente como título executivo. Está clara a desnecessidade das testemunhas, desde que a integridade da assinatura eletrônica das partes possa ser conferida por provedor de assinatura.
Em caso de dúvidas quanto à espécie da assinatura usada em cada caso, recomenda-se que continuem sendo utilizadas a assinatura das testemunhas e a menção à anuência das partes. São medidas de fácil adoção, que aumentam o grau de confiabilidade e garantem a exequibilidade dos contratos.
Pode-se dizer que a nova Lei contribui para a desburocratização e democratização – no sentido de ampliação – do uso de contratos assinados eletronicamente, tanto no meio empresarial e dos negócios quanto pelos cidadãos em geral. Propostas, declarações, contratos de locação, de trabalho, de prestação de serviço e de compra e venda, entre outros, podem agora ser constituídos com maior agilidade e segurança.
É o uso da tecnologia em prol da eficiência das relações jurídicas – novidade sempre bem-vinda em um país ainda tão burocrático como o Brasil, onde se chega a cobrar do cidadão comum, sem praticamente nenhum protesto, cerca de 5% do salário-mínimo nacional para a obtenção de um simples reconhecimento de firma.[1]
[1] Preço de abertura e reconhecimento de firma por autenticidade praticado no Estado do Rio de Janeiro em 2023. Disponível em: http://www.cartoriobarrarj.com.br/tabela-de-precos/
José Eduardo Berto Galdiano
Advogado em São Paulo, sócio fundador do BGCA Advogados, graduado e pós-graduado pela PUC-SP, mestre pela USP.
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